Bernado Tabak
Do G1, no Rio
Apesar do crescimento econômico, que levou o país a ultrapassar o Reino
Unido e consolidar o sexto maior Produto Interno Bruto (PIB) do planeta,
o Brasil ainda é uma nação de desigualdades. Segundo relatório sobre as
cidades latino-americanas feito pelo Programa das Nações Unidas para os
Assentamentos Humanos (ONU-Habitat), o Brasil é o quarto país mais
desigual da América Latina em distribuição de renda, ficando atrás
somente de Guatemala, Honduras e Colômbia.
O Brasil, no entanto, avançou no combate a desigualdades nas últimas
décadas. De acordo com o estudo, o país era, em 1990, o número 1 do
ranking das nações com pior distribuição de renda.
De acordo com o levantamento “Estado das cidades da América Latina e do
Caribe 2012 – Rumo a uma nova transição urbana”, divulgado nesta
terça-feira (21), a América Latina é a região mais urbanizada do mundo. O
relatório projeta que a taxa de população urbana chegará a 89% em 2050.
O índice de urbanização brasileira foi o maior em toda a América
Latina, entre 1970 e 2010. Hoje, 86,53% da população brasileira vivem em
cidades.
O rápido crescimento, no entanto, não significou o desenvolvimento das
regiões urbanas do país, que sofrem com problemas de infraestrutura,
moradia, transporte, poluição e segurança pública. Além disso, cinco
cidades brasileiras estão entre as que têm pior distribuição de renda
entre as camadas da população em toda a América Latina: Goiânia,
Fortaleza, Belo Horizonte, Brasília e Curitiba.
O estudo destaca o forte crescimento do PIB brasileiro, de 1970 a 2009,
deixando para trás o México e os países que formam o Cone Sul –
Argentina, Chile, Uruguai e Paraguai – e “cobrando relevância mundial”.
Hoje, o PIB do país representa 32% do total do PIB da América Latina.
Ainda assim, quando se analisa o PIB per capita, o Brasil ocupa uma
modesta 13ª colocação, de pouco mais de US$ 4 mil por ano, abaixo da
média latino-americana e dos países mais desenvolvidos da região, como
México, Chile, Argentina e Uruguai, e até mesmo da Venezuela, que tem a
economia muito dependente do petróleo.
O Brasil ainda perde para a maioria dos vizinhos na questão da pobreza.
Pouco mais de 20% da população vivem em situação de pobreza ou
indigência, percentual maior do que no Uruguai, na Argentina, no Chile e
no Peru. Costa Rica e Panamá também ficam a frente do Brasil, com
menores percentuais na Taxa de Pobreza Urbana.
Entretanto, o número de pobres e indigentes no Brasil caiu pela metade
em duas décadas: de 41%, em 1990, para 22% da população em 2009.
Argentina e Uruguai também reduziram pela metade o número de pobres, que
hoje são 9% da população, em ambos os países. Mas foi o Chile o grande
campeão no combate à pobreza, com redução de 70% - de 39%, em 1990, para
12%, em 2009, referente a percentual da população pobre no país.
De acordo com o pesquisador Erick Vittrup, oficial principal de
assentamentos humanos da ONU-Habitat, hoje existem 124 milhões de
pessoas pobres vivendo nas cidades, o que equivale a cerca de 25% da
população total da América Latina. Destes, 111 milhões moram em favelas.
A ONU-Habitat considera como pobre quem vive com menos de US$ 2 por dia
(cerca de R$4). “Se nada for feito para mudar esse panorama, em nível
mundial, toda a população urbana de hoje, que corresponde a 3,5 bilhões
de pessoas, vai morar em favelas, em 2050”, afirmou. Atualmente, 1
bilhão de pessoas vivem em favelas, em uma população global de 7 milhões
de pessoas.
Veja o que o relatório fala sobre alguns indicadores brasileiros:
Saneamento
O estudo da ONU-Habitat mostra que o Brasil é apenas a 19ª nação da
América Latina em atendimento de saneamento básico. De acordo com a
pesquisa, pouco mais de 85% da população urbana têm saneamento em casa,
sendo que as cidades intermediárias são as menos favorecidas neste
quesito.
Água
Erick Vittrup ressalta que, apesar de quase a totalidade do território
urbano brasileiro ser coberto por abastecimento de água encanada, ainda
há muitos problemas de fornecimento em favelas e em áreas na periferia
das cidades, onde o fornecimento sofre interrupções com alguma
frequência. “A qualidade da água em muitas regiões também é ruim, pois
existe uma cobertura precária de estações de tratamento”, disse.
Favelas
O Brasil é o 14ª país da América Latina, segundo o relatório, com mais
pessoas vivendo em favelas. No país, 28% da população moram em
comunidades com infraestrutura precária, a grande maioria em situação
informal. O índice de moradores de favelas no Brasil é mais alto do que a
média latino-americana, de 26%.
Poluição
O levantamento afirma que o Brasil é o segundo maior poluidor da
América Latina, responsável pela emissão de 23% gases que provocam o
efeito estufa na região. O percentual é igual às emissões de todos os
países do Caribe somados aos quatro países do Cone Sul. O Brasil só
perde para o México, que é responsável pela emissão de 30% dos gases
poluidores na região. De acordo com a pesquisa, 77% do gás carbônico
emitido na cidade de São Paulo são originados de veículos de transporte
individual, como carros de passeio, caminhonetes, picapes e motos – o
percentual mais alto do Brasil.
Transportes
São Paulo também é citada no estudo como uma das cidades brasileiras
que mais sofrem com o trânsito. Segundo o relatório, cada ocupante de um
automóvel produz, em quantidade de horas, 11 vezes mais
congestionamento do que o passageiro de um ônibus. Ainda de acordo com o
estudo, os engarrafamentos na capital paulista ocasionam um custo
adicional de operação de 15,8% para os transportes públicos.
Violência e feminicídio
O relatório afirma que a violência e a delinquência são consideradas,
de acordo com pesquisas de opinião, as principais preocupações dos
cidadãos latino-americanos. A Taxa de Homicídios anual da Região é a
mais elevada do mundo, com mais de 20 mortes por cada 100 mil
habitantes. “O Rio de Janeiro já esteve no top 10 das cidades mais
violentas. Agora, as cidades mais inseguras se encontram na Guatemala e
no México. Mas o Brasil ainda tem cidades muito violentas”, afirma Erick
Vittrup.
O estudo ainda afirma que o Brasil é um dos países com a mais alta taxa
de feminicídio - todos os assassinatos de mulheres relacionados à
violência de gênero - do mundo, ficando na 11ª colocação na América
Latina.
Futuro promissor à vista
O levantamento da ONU-Habitat ressalta que, apesar dos problemas e
desafios para desenvolver as cidades, o Brasil e a América Latina estão
prestes a viver um novo ciclo de transição urbana, que tem como objetivo
garantir a “melhora fundamental da qualidade de vida nas cidades”, com
igualdade e sustentabilidade.
O estudo ainda afirma que “um dos casos mais famosos e exitosos” da
América Latina com relação à regulamentação da administração pública das
cidades é a Lei de Responsabilidade Fiscal, promulgada no Brasil em
2000. A lei impõe um controle na capacidade de endividamento e
equilíbrio nas contas públicas, e proíbe a acumulação de déficits de um
período de governo para outro.
Para Erick Vittrup, as principais soluções para as cidades consistem em
promover políticas de harmonização e coesão territorial, acelerar o
ritmo das reformas urbanas e investir mais esforços no monitoramento das
cidades. Para ele, existe experiência, capacidade, recursos e
consciência política para melhorar a qualidade de vida nas cidades. “O
principal desafio é como desenvolver instrumentos para combater as
desigualdades enormes dentro das cidades”, finaliza.
Veja todas as tabelas neste endereço:
http://g1.globo.com/brasil/noticia/2012/08/brasil-avanca-mas-e-quarto-pais-mais-desigual-da-america-latina-diz-onu.html