EDIÇÃO 149/AGOSTO DE 2012
08/08/2012
Enquanto os cientistas tremem de frio, micróbios proliferam no solo de um vulcão
por Olivia Judson
Fonte: NATIONAL GEOGRAPHIC BRASIL
Um estudo de contrastes: gelo e neve em primeiro plano e lago de lava
embaixo. O Erebus é um dos muitos vulcões que têm um lago permanente. No
momento em que esta foto foi tirada, o vulcão estava quieto, mas com
frequência entra em erupção e lança bombas de lava a grandes altitudes.
A cena: uma barraca no monte Erebus, um vulcão ativo na ilha Ross, na
Antártica. É uma tenda quadrangular como as que o capitão Robert Falcon
Scott trouxe em suas expedições à Antártica mais de um século atrás. No
centro, tem altura suficiente para que uma pessoa de mais ou menos 1,65
metro fique em pé e, no topo, há duas aberturas que servem de chaminé.
Essa tenda específica é ocupada por duas pessoas; ambas estão enfiadas
em seus sacos de dormir. Entre elas há uma caixa grande, um fogareiro
Primus, duas garrafas térmicas e dois pares de botas pesadas. Está frio
demais para ler; mesmo de luva não dá para segurar nenhum livro. Por
isso, todos os reclusos – inclusive eu – conversam para passar o tempo.
“Quais são seus micróbios favoritos?”, pergunto, espanando o gelo em
flocos de meu saco de dormir.
Fonte: http://www.viagemdoconhecimento.com.br/noticias/national-geographic/antartica-enquanto-cientistas-tremem-de-frio-microbios-proliferam-no-interior-de-um-vulcao.php
“Só podem ser as estrambóticas arqueias”, responde meu companheiro,
Craig Herbold, um americano trintão, corpulento, fã de música eletrônica
japonesa e da astrobiologia, o estudo de como pode ser a vida em outras
partes do universo. Ele é pesquisador pós-doutorando da Universidade de
Waikato da Nova Zelândia, e o membro mais novo de uma equipe de três
pessoas que vieram para cá em busca de formas de vida nos solos quentes
do vulcão. É isso mesmo. Ele veio a um dos lugares mais frios da Terra
procurar seres que prosperam no calor.
O grupo de Shackleton subiu o Erebus em cinco dias e meio. Durante a
façanha, enfrentaram uma nevasca que os manteve nos sacos de dormir por
mais de 24 horas, sem nada para beber e a temperaturas abaixo de -34ºC.
Um homem desmaiou de exaustão e outro sofreu uma lesão pelo frio que o
fez perder o dedão do pé. Nossa jornada foi menos árdua: fomos de
helicóptero.
Éramos oito. Havia o já mencionado Herbold e os dois membros mais
velhos de sua equipe de pesquisa: Craig Cary, um americano expansivo, e
Ian McDonald, um inglês discretíssimo, ambos biólogos da Universidade de
Waikato e veteranos de pesquisas na Antártica. Antes de iniciar seu
trabalho no continente gelado, Cary lecionava na Universidade de
Delaware, na costa nordeste dos Estados Unidos, e descia com
regularidade ao fundo do mar para estudar organismos que vivem em
chaminés oceânicas profundas. Stu Arnold e Al Moore, dois neozelandeses
queimados de sol e vento, de ombros largos e sotaque pronunciado, eram
encarregados de, nas palavras de Arnold, impedir que fôssemos
“massacrados pela montanha”. Havia Carsten Peter, o fotógrafo, e seu
assistente, Daniel Jehle, ambos das serras do sul da Alemanha. E eu. Nas
palavras de Jehle, apenas “uma garota”.
Apesar da localização remota e do clima brutal – temperaturas médias de
-20°C no verão e -50°C no inverno –, o Erebus é um vulcão muito
estudado. Desde 1972, uma equipe de vulcanólogos, há tempos chefiada por
Philip Kyle, professor de geoquímica do Instituto de Mineração e
Tecnologia do Novo México, passa parte do verão austral na montanha,
investigando questões como natureza e frequência das erupções, tipos de
gás que emite e idade das rochas.
A biologia do lugar, contudo, não é tão bem documentada. Isso acontece,
em parte, porque no Erebus a maioria das formas de vida é microscópica.
(As principais exceções são alguns musgos e cianobactérias – bactérias
que, como as plantas, transformam a luz solar em energia e podem formar
colônias grandes o suficiente para ser vistas.) Até pouco tempo atrás, o
estudo de micróbios desconhecidos era problemático: não se podia
criá-los em laboratório nem descrevê- los e muito menos estudá-los.
Mas hoje não é mais preciso cultivar micróbio em laboratório para
aprender algo sobre ele. Há mais ou menos uma década, vêm sendo
desenvolvidas técnicas genéticas que permitem caracterizar uma
comunidade inteira de micróbios só por seu DNA, o que nos dá um quadro
bem mais completo do que vive em qual lugar. Assim, embora tenha sido
encontrada vida nos solos quentes do Erebus no começo dos anos 1960, só
agora conseguimos avançar bastante nesse estudo.
Os solos quentes do Erebus são pontilhados no topo, ainda mais no local
conhecido como crista Tramway. O calor derrete o gelo e cria pequenos
trechos de solo quente e úmido que abrigam comunidades de musgos e
micróbios.
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